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Fiéis celebram São Jorge, o santo guerreiro das batalhas do cotidiano

Católicos, cristãos de outras vertentes e adeptos das religiões afro-brasileiras reverenciam a figura mítica que simboliza coragem, proteção e resistência. Missas e procissões reuniram devotos

Antes mesmo do amanhecer desta terça-feira (23/4), fiéis já lotavam as ruas de Quintino, na zona norte do Rio de Janeiro, para homenagear São Jorge, um dos santos mais populares do Brasil. A tradicional queima de fogos às cinco da manhã marcou o início oficial do feriado estadual em louvor ao santo, cuja imagem transcende fronteiras religiosas e se tornou símbolo de fé e força diante das adversidades.

Celebrado pela Igreja Católica como padroeiro dos soldados, cavaleiros e escoteiros, São Jorge também é venerado por igrejas ortodoxas e anglicanas e tem forte presença no imaginário de religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé, onde é associado ao orixá Ogum. Em todas essas expressões, ele representa um guerreiro espiritual, defensor do bem e da justiça.

A devoção a São Jorge cresce a cada ano, especialmente entre aqueles que enfrentam batalhas diárias. “Ele é um santo da rua, do cotidiano, dos milagres diários. É invocado por quem enfrenta lutas reais, não metafísicas”, resume o historiador Luiz Antonio Simas, autor do livro O Cavaleiro da Lua: Cordel para São Jorge.

Em Manaus, a fé também tomou conta das ruas. Fiéis participaram de missas e procissões organizadas em várias comunidades, como na paróquia de São Jorge, no bairro de mesmo nome, onde devotos fizeram homenagens com vestimentas vermelhas, velas acesas e pedidos por proteção. Terreiros de umbanda e candomblé realizaram rituais e oferendas ao orixá Ogum, reforçando a força do sincretismo religioso na Amazônia.

A origem da figura de São Jorge remonta ao século III, quando o jovem militar cristão da Capadócia, atual Turquia, enfrentou o imperador romano Diocleciano ao recusar-se a perseguir cristãos, sendo martirizado por sua fé. Com o tempo, a imagem lendária do cavaleiro que derrota um dragão para salvar uma princesa tornou-se símbolo da vitória do bem sobre o mal — uma metáfora poderosa que atravessou séculos e fronteiras.

No Brasil, a associação entre São Jorge e Ogum surgiu como forma de resistência cultural durante a colonização. “O sincretismo não deve ser romantizado. Foi uma forma de sobrevivência diante da violência da imposição religiosa europeia. Mas nossos ancestrais ressignificaram os símbolos e os transformaram em potências de fé”, explica a socióloga e mãe de santo Flávia Pinto.

Mesmo entre os muçulmanos, há registros de respeito à figura de Jorge. Alguns estudiosos identificam possíveis referências a ele no Alcorão, onde seria representado como Al-Khidr — o “verde”, associado ao conhecimento e à justiça.

Do catolicismo às religiões de matriz africana, passando por outras tradições e crenças populares, São Jorge continua a ser um símbolo poderoso. Um cavaleiro que, armado com fé e coragem, segue inspirando aqueles que acreditam que, por mais feroz que seja o dragão, nenhuma batalha é invencível.

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