DESTAQUEREGIÃO AMAZÔNICA

Projeto oferece mais segurança na comercialização de combustível no interior do Amazonas

Projeto Amazonas Sustentável, executado pela Fundação Amazonas Sustentável (FAS) em parceria com a Petrobras, capacitou comerciantes e melhorou a infraestrutura de 31 pontos venda de gasolina e diesel.

Se você precisar se deslocar de um ponto a outro na sua cidade, possivelmente vai conseguir abastecer seu carro ou moto em algum posto de combustível no caminho. No interior do Amazonas, a definição de posto tem outro formato e estrutura. Gasolina ou diesel são comercializados em algum espaço improvisado, geralmente dentro da própria residência dos vendedores ou em casinhas de madeira. Fechadas, sem segurança, relatos de acidentes não são raros, além dos riscos para a saúde com a sucção do combustível e armazenamento em garrafas pet.

Para oferecer mais segurança, a iniciativa “Pontão Caboclo Sustentável” capacitou e mudou a infraestrutura de 31 pontos de venda, beneficiando aproximadamente 136 pessoas que moram na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Negro, que tem a gestão da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amazonas. “O combustível é muito importante na comunidade. Aqui todo mundo reclama quando falta luz, porque chega a ‘quentura’, o carapanã, mas aí usa o combustível para ligar o gerador e ter ventilador, televisão”, disse Ezio Chagas Figueira, da comunidade do Saracá. 

“A FAS e a Petrobras trouxeram o curso NR-20. Eu achava que trabalhava certo, mas com o curso eu vi que não. Aprendi como trabalhar de maneira sustentável, no meu ponto de venda de combustível, para ter mais saúde e segurança”. A NR-20 é uma norma regulamentadora do Ministério do Trabalho que normatiza a segurança e saúde no trabalho com inflamáveis e combustíveis.

Ezio foi um dos que aceitou a iniciativa cujas mudanças começaram pela nova estrutura do ponto de venda. A casa de madeira, para armazenar o combustível, foi substituída por uma de alvenaria – uma contrapartida do beneficiário para receber o investimento da FAS e Petrobras, estimado em 17 mil reais. Antes, a casa de madeira era totalmente fechada, o que podia resultar o risco de uma explosão de grandes proporções, em função da falta de ventilação. A nova estrutura é uma área que varia entre 12 e 15 m². As paredes de alvenaria geralmente têm 1 metro de altura e o restante é composto por grades de ferros, facilitando a ventilação.

Jacikele Santos, presidente da Comunidade Terra Preta, trabalha há mais de seis anos com a venda de combustível. Quando soube do curso, acreditou na possibilidade de exercer a atividade de maneira mais segura e menos irregular. “Quando a gente puxa o combustível na mangueira, a gente sabe que é muito prejudicial para a saúde. Depois do curso, a gente trabalhou para fazer nosso posto de combustível e aquilo que era um sonho, virou realidade. Hoje, a gente já sabe qual é a forma correta de manusear o combustível”.

Segundo Gil Lima, coordenador do projeto, o diferencial da proposta é o trabalho compartilhado com as comunidades. “A FAS atua de forma conjunta e compartilhada com as comunidades, então com o projeto, cujo foco é partilha de conhecimento para o melhor manuseio de inflamáveis e combustíveis, associado a equipamentos mais adequados à realidade ribeirinha, não poderia ser diferente. Em contrapartida, eles fazem a infraestrutura, investindo até três mil reais. Assim, entendemos que é muito melhor trabalhar em conjunto. O resultado principal é ver o engajamento, tanto das pessoas que estão mais tempo trabalhando com essa atividade quanto dos filhos, que acabam avaliando a forma como faziam as coisas. A gente associa a expertise da FAS em tecnologias sociais com a realidade local e o conhecimento tradicional”.

Com a palavra, as “donas” do pontão

Em homenagem ao filho, Neila, mãe de Alison, batizou o local de “Pontão Alisson”. Quezia, professora de formação, terá o pontão como seu primeiro negócio. Ivaneide fez o curso e agora é a proprietária do espaço. Dos 31 beneficiários atendidos pelo projeto, cerca de 32% são de beneficiárias, ou seja, mulheres que enxergam na comercialização de combustível uma oportunidade de aumentar a renda.

Algumas delas voltaram para o negócio por acaso. Foi o que aconteceu com Ivaneide de Souza Ramos, da comunidade do Tumbira. A venda de diesel ou gasolina não é nova para sua família. Ela e o marido mantinham um pequeno comércio, há uns dez anos, mas acabaram ficando sem dinheiro para comprar grandes quantidades. O marido soube do curso, mas não pôde participar e Ivaneide o “representou”. “Aí eu fiquei na frente, porque eu fiz o curso!”, disse.

Para Ivaneide, o curso realizado pela FAS auxiliou no desejo de novamente ter mais uma opção de renda, além de trabalhar em seu próprio negócio. “Você trabalhar para si mesmo, é melhor do que trabalhar fora. É outra coisa você trabalhar na sua própria casa. Com a chegada dos equipamentos, a gente vai recomeçar e acredito que agora vai dar certo. E já estamos pensando em aumentar, já vamos vender gasolina e diesel e depois queremos vender gás também”. A “dona” do pontão também deixa para trás práticas que resultaram em insegurança e riscos à saúde.

Na comunidade Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, a comerciante de taberna Neila Costa dos Santos viu no Pontão Caboclo Sustentável uma oportunidade para comercializar combustível de maneira segura: “A vontade de trabalhar de uma maneira organizada, sem correr riscos, sem colocar em risco a vista das pessoas, pois sabemos que trabalhar com combustível é arriscado. Eu vi no curso uma maneira de melhorar o negócio”. Neila correu contra o tempo para conseguir finalizar o espaço, que recebeu o nome do filho: “O pontão do Alisson foi uma homenagem ao nosso bebê de oito meses. Ele é muito animado e muito alegre, por isso, ele me inspira e faz eu me sentir mais forte”, disse Neila.

Acompanhando a iniciativa desde o início, Elizeu Silva, assistente de empreendedorismo do Projeto, afirma que “as mulheres têm uma participação muito forte no projeto e essa cabocla é uma mulher muito guerreira. Enquanto o marido está na pesca ou na agricultura, ela está no comércio. Então, mesmo cuidando da casa, do maridos e dos filhos, ela está sempre em busca de informações para melhorar o trabalho”. 

As etapas do projeto

A primeira etapa do projeto foi um diagnóstico da situação dos empreendimentos realizado no primeiro semestre de 2019. “Nós iniciamos o projeto com um diagnóstico para identificar as pessoas que o projeto podia trabalhar, que eram as pessoas que ainda não sabiam como manusear líquidos inflamáveis de forma adequada. Com esse diagnóstico, nos deparamos com a realidade local que é armazenar o combustível em casa, na cozinha e até mesmo perto de fogão”, disse Gil. 

A segunda etapa foi a contratação de um consultor para realizar um treinamento de 16 horas para os comerciantes internalizarem a NR-20. Depois disso, na terceira etapa do projeto, eles tiveram um prazo de seis meses para se adequar à diretrizes principais da norma e construir os novos modelos adaptados dos “pontões”. Em paralelo, também participaram de oficinas de gestão sobre questões financeiras e de mercado para buscar o sucesso de um empreendimento, conforme explicou Elizeu: “Muitos empresários não sabem se estão tendo lucro ou não. Quando você aborda o empreendedorismo, você mostra como ele pode ter esse controle e como ele poderá visualizar novas oportunidades para o negócio”. 

A quarta etapa foi a expedição, realizada de 14 a 18 de agosto, com o objetivo de visitar os novos pontos de venda para entrega dos equipamentos, que consistem em kits de combustível, formados por reservatório de mil litros, bomba elétrica, medidor mecânico, bomba manual para diesel, além de dois extintores de incêndio, um uniforme, placas de sinalização, kit de teste de combustível e de primeiros socorros e apoio à gestão.

Na opinião de Elizeu, o resultado vai trazer melhorias para a comercialização dos combustíveis, maior segurança, mas também felicidade: “O que a gente percebe quando eles recebem o kit é o sentimento de alegria. De algo que começou com um diagnóstico, depois teve o curso e agora se tornou real, principalmente porque você está ajudando a organizar uma atividade que antes tinha pouca segurança e agora vai ter mais”. O Projeto Amazonas Sustentável vai acompanhar a implantação dos Pontões Caboclos Sustentáveis pelos próximos meses, monitorando os equipamentos, mas também a comercialização e a adequação das comunidades frente aos novos procedimentos. 

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